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Médicos que aceitam refeição paga pela indústria farmacêutica prescrevem droga mais cara


Data de publicação: 22 de junho de 2016

O ditado “Não existe almoço grátis” foi comprovado cientificamente por um novo estudo. O pior é que a conta é paga por quem precisa de um tratamento médico. Pesquisadores da Universidade da Califórnia, em San Francisco, constataram que os médicos que aceitam refeições pagas pela indústria farmacêutica são mais propensos a receitar medicamentos de marca – mais caros – e não os genéricos – mais baratos – que são encontrados no mercado. Em alguns casos, a frequência da prescrição de uma droga específica aumentou em mais de cinco vezes. O estudo, publicado hoje em uma das revistas da Associação Médica Americana, vai ao centro de um dos temas mais delicados da medicina moderna: a influência da indústria farmacêutica na prática médica.

Os pesquisadores da equipe do médico R. Adams Dudley usaram um recurso valioso, à disposição nos Estados Unidos. Lá, desde que a reforma da saúde implantada pelo presidente Barack Obama entrou em vigor, em 2014, as empresas farmacêuticas são obrigadas a informar pública e nominalmente quais médicos receberam verbas de marketing da empresa – e quanto eles receberam. Isso inclui desde honorários para falar sobre um produto até almoços de relacionamento. O programa chamado Open Payments, algo como Pagamentos Abertos em português, foi implantado para coibir os conflitos de interesse que podem influenciar a pesquisa de novos medicamentos, a formação dos futuros médicos e a prática clínica dos profissionais. Além disso, quanto mais as empresas gastam com publicidade, mais caros ficam os medicamentos. Para os pacientes e para o sistema de saúde.

A equipe de pesquisadores cruzou alguns dos dados do Open Payments com as prescrições feitas pelos médicos e registradas em um dos sistemas de saúde do governo, o Medicare, voltado para pessoas com mais de 65 anos. O resultado não é uma surpresa: parece existir uma relação entre o maior contato dos médicos com a indústria e a prescrição de medicamentos da empresa. Mas o mais surpreendente foi a constatação de que mesmo os pagamentos módicos – refeições que custaram menos de US$ 20 – tiveram influência na maneira como os profissionais prescreviam. Dos mais de 63 mil pagamentos avaliados, 95% correspondiam a refeições cujo valor médio era US$ 20 (cerca de R$ 70). Apenas 5% eram referentes a viagens, honorários de palestras ou recebimento de livros. Isso significa que, mesmo médicos que tentem limitar seu contato com a indústria a alguns parâmetros, podem sofrer – consciente ou inconscientemente –infuência na hora de prescrever.

Os pesquisadores analisaram a prescrição de drogas para reduzir o colesterol, duas classes de medicamentos para controlar a pressão arterial e antidepressivos. As refeições pagas aumentaram em 1,8 vezes o receituário das drogas de marca contra o colesterol e em 3,4 vezes a prescrição de antidepressivos específicos. O aumento mais expressivo foi nos medicamentos para controlar a pressão arterial. Em uma das classes, as refeições tornaram a prescrição de drogas de marca 4,5 vezes mais frequente. Na segunda classe, 5,4 vezes. O receituário de quase 156 mil médicos foi avaliado. Quanto mais frequentes eram os encontros em que houve o pagamento da refeição ou quanto mais cara era a refeição, maior era o aumento na prescrição.

Os autores são cuidadosos ao traçar uma relação de causa e efeito entre os pagamentos e os receituários. De fato, não se pode afirmar que os médicos se sentiram na obrigação de prescrever as drogas de marca porque receberam gentilezas da empresa. Os próprios pesquisadores levantam a hipótese de que muitos profissionais iam aos encontros porque já usavam os produtos da empresa. Mas outros levantamentos semelhantes, como um feito pela agência de jornalismo americana ProPublica em março, encontraram o mesmo tipo de resultado. É um indício de que os profissionais da medicina – assim como de qualquer outra área – podem ser influenciados pelo fator reciprocidade. Ou, pelo menos, são tão suscetíveis a estratégias de marketing como a maioria das pessoas. Daí a importância de políticas que tentem blindar médicos e pacientes de práticas que possam influenciar no tratamento. 

No Brasil, não existe nada parecido com o programa Open Payments, dos Estados Unidos. Seria uma boa oportunidade de tornar a relação médico-indústria mais transparente. Para o presidente do Conselho Federal de Medicina, o CFM, que regula a prática médica no país, programas desse tipo desrespeitam princípios éticos. “Não se pode violar o sigilo da relação médico-paciente registrando o que os médicos prescrevem”, afirma Carlos Vital Tavares Corrêa Lima, do CFM. Mas ele reconhece que a própria indústria acaba sabendo o que muitos médicos prescrevem. As estratégias pelas quais a indústria descobre essas informações não são abertamente explicadas. No programa americano, os dados pessoais dos pacientes não são revelados publicamente.

A relação entre os médicos e a indústria farmacêutica no Brasil costuma ser alvo de críticas. Não faltam diretrizes. O Código de Ética Médica, do CFM, traz suas recomendações, assim como resoluções dos conselhos regionais de medicina e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que regula a propaganda de medicamentos. A própria indústria, representada pela Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa, tem seu código de boas práticas, reconhecido pelo CFM. O problema, segundo especialistas, é que as diretrizes são brandas demais. “O conflito de interesses é um assunto muito mal regulado no país”, afirma Mario Scheffer, professor do Departamento de Medicina Preventina da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). “Começa na faculdade, com a indústria patrocinando churrasco e cervejadas, e vai até os congressos, usados por muitos médicos para se atualizar”, diz Scheffer. “A programação é pautada pelos interesses das empresas e os médicos ficam vulneráveis a essa influência. Muitos já não têm a formação adequada por causa da precariedade de alguns cursos e ainda existe a dificuldade de se atualizar porque têm múltiplos empregos.”

Para o médico gaúcho Guilherme Barcellos, que já encabeçou uma campanha para diminuir a influência da indústria farmacêutica, deveria existir mais controle sobre as instituições e não sobre os médicos. “As diretrizes costumam ditar que tipo de brinde o médico pode ou não pode receber, mas não são tão severas com o patrocínio de eventos promovidos pelas sociedades médicas”, afirma Barcellos. Ele diz não receber visitas de representantes comerciais das empresas farmacêuticas e tem como uma de suas bandeiras promover eventos sem patrocínio da indústria. “Esse assunto é muito desconfortável para os médicos. Eles nunca acham que eles mesmos estão sujeitos à influência”, afirma Barcellos.

A percepção de Barcellos é verdadeira, segundo uma pesquisa feita em 2010 com profissionais paulistas. O levantamento encomendado pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, o Cremesp, mostrou que 62% avaliavam positivamente a relação com a indústria. Para eles, era uma fonte de informações científicas atualizadas, novos medicamentos e apoio técnico. Mais de 90% afirmaram receber brindes e benefícios das empresas e 80% relataram receber visitas de representantes da indústria de medicamentos.

De acordo com os códigos médicos, não há nenhuma incorrência ética em ir a congressos realizados com o patrocínio da indústria ou em receber representantes comerciais no consultório. Talvez, seja um bom remédio para os médicos refletir sobre o quanto possíveis decisões clínicas podem ser influenciadas pelas informações que estão facilmente a sua disposição. Os pacientes podem ajudá-los nessa reflexão, quando questionam os motivos por que aquele medicamento específico lhe foi prescrito, quais são as evidências que existem a favor dele e de seus concorrentes, quando questionam por que um genérico não poderia ser adotado. Os maiores favorecidos são os próprios pacientes. “Os gastos da indústria farmacêutica com marketing são muito altos e estão embutidos no preço final dos medicamentos”, afirma Scheffer, da USP. “Quem paga a conta é a sociedade.”

Fonte: Época

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